Rodrigo Mello Rego – As Certinhas do Oleari + Poesia Erótica / Que seja em Segredo, livro de Ana Miranda: o túnel das freiras e padres
Publicado em 09/set/2017, 07:08
Por Don Oleari
Senhor Editor e senhores leitores
Lavo minhas mãos, que na verdade, afirmo, nunca foram sujas ao empenhá-las nos meus modestos escritos literários.
E se simbolicamente exerço esse direito é porque esta coluna invoca o testemunho, acima de qualquer suspeição, da renomada escritora Ana Miranda (Prêmio Jaboti, 1990) em seu livro “Que seja em segredo”, editado pela conceituada L&PM.
A instigante obra reúne poemas eróticos “escritos na devassidão dos conventos brasileiros e portugueses dos Séculos XVII e XVIII” e, sobretudo, confirma nossa tese de que o erotismo é uma forma de manifestação presente em nosso cotidiano desde quando, no Gênesis, é narrada a história de Adão e Eva (imagem: Mabuse, Século XVI) e os motivos que os levaram à expulsão do Paraíso.
Coça-me a lembrança de quando, ainda jovens, eu e meus companheiros de escola líamos a história do terremoto que atingiu Lisboa, Setúbal e no Algarve, ocorrido no dia 1º de novembro de 1755 – Dia de Todos os Santos.
Tempos passados, entendemos o comportamento do nosso Imperador Dom Pedro I nas alcovas do Império:
Praticamente toda capital portuguesa foi destruída pelo abalo e pelo incêndio que o sucedeu, causando mais de 30 mil mortes.
A nossa irreverência, distante da catástrofe, era voltada para a descoberta de um túnel com centenas de metros de extensão ligando o mosteiro dos frades, na cidade baixa, ao convento das monjas, mais ao alto. E nossa imaginação corria solta projetando os orgíacos encontros fortuitos entre os padres e as freiras, na calada da noite.
– o filho bastardo com a monja portuguesa Ana Augusta Peregrino Faleiro…
Pois agora, mais de 360 anos passados, vê-se que aquele “túnel do amor” e as aventuras extra-conjugais de D. Pedro I não foram episódios isolados no tempo.
O livro de Ana Miranda (foto) “Que seja um segredo” nos mostra que o erotismo na poesia de Bocage é quase uma historinha que pode ser discretamente lida nas sombras de um convento das”Carmelitas Descalças”.
Elencamos trechos de poemas dessa linha de criação, e um deles, “Definição de Uma Freira”, do português Antônio Barbosa Bacelar (1610/1663), é apontado como clássico:
– Puta dum corno, dos diabos freira
Eu me ausento por não mais aturar-te
Tu cá ficas, podes esfregar-te
Com quem melhor te apague essa coceira.
De Frei Antonio das Chagas:
Vem a ser que a freirinha
Se enamorou de outra freira
Mais que mancebo cá fora
Quis, lá dentro, ter manceba.
Para quem se interessa pelo assunto e queira mergulhar mais fundo nas sombras dos antigos mosteiros brasileiros e portugueses e dos monges e freiras que o ocuparam, esta coluna sugere a leitura do livro de Ana Miranda.
É fascinante.
Rodrigo Mello Rego”.
Rodrigo Mello Rego
é jornalista com
Mestrado Estudos
Literários.
Pesquisador de literatura erótica.
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