Aqui Rubens Pontes: meu poema de sábado / Futebol, de Carlos Drummond de Andrade
Publicado em 15/jun/2018, 08:47
Por Don Oleari
A nossa seleção de futebol estreia na Copa do Mundo e até os setores sadios do Brasil param
numa espécie de catarse para afugentar as mazelas que nos assolam.
Como o Carnaval, futebol é uma palavra mágica para nós, e já Carlos Drumond de Andrade batia no peito quando escreveu:
– “Confesso que o futebol me aturde, porque não sei chegar até seu mistério.”
Mas foi além dessa confissão. Ele próprio, o poeta de Itabira nas Gerais, deixou para as gerações que vieram depois dele, “Meu coração no México”, quando o Brasil maravilhou o mundo durante a Copa sediada naquele País.
Outros grandes poetas se renderam ao encanto do nosso esporte maior, como João Cabral de Melo Neto (foto) em“O futebol brasileiro”:
A bola não é inimiga,
como o touro na corrida;
e, embora seja um utensílio
caseiro e que se usa sem risco
não é o utensílio impessoal
sempre manso, de gesto usual;
é um utensilio semivivo
de reações próprias como o bicho
e que como bicho, é mister
(mais que bicho, como mulher)
usar malícia atenção
dando aos pés astucias de mão.”
Chico Buarque, contundente, burlou a censura e musicou:
“Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock’n’roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta”.
Paulo Mendes Campos, torcedor do
Flamengo, versejou:
“Bailando sem jogar, gemia Macalé
Quem me dera que fosse o preto Moacir
que vive no Flamengo, estrela a reluzir. “
Vinicius de Moraes em soneto primoroso, homenageia Garrincha como “O anjo das pernas tortas”
“A um passe de Didi, Garrincha avança…
Colado o couro nos pés, o olhar atento
Dribla um, dribla dois, depois descansa
Como a medir o lance do momento….”
Adriana Calcanhoto cantou
“Futebol sem bola
pipiu sem frajola
sou eu assim sem você.
Ferreira Gullar, imortal da ABL, se encantou com o malabarismo dos craques de futebol:
“A esfera desce
do espaço
ele a apara no peito
e para no ar.
Depois, com o joelho,
a dispõe a meia-altura…”
É assim, pois, que o Portal Don Oleari, a Rádio Clube da Boa Música e este colunista se solidarizam com os amantes
do futebol (como nosotros, Atlemengos, ou FLAtleticanos, como diz o Oleari) selecionando para este sábado um poema do mágico Carlos Drummond de Andrade:
De Capim Branco, MG., Rubens Pontes”.
À direita, dois ídolos, Nunes e Ronaldo, exibem camisas de Flamengo e Atlético mineiro.
Futebol
Carlos Drummond de Andrade
Futebol se joga no estádio?
Futebol se joga na praia,
futebol se joga na rua,
futebol se joga na alma.
A bola é a mesma: forma sacra
para craques e pernas de pau.
Mesma a volúpia de chutar
na delirante copa-mundo
ou no árido espaço do morro.
São voos de estátuas súbitas,
desenhos feéricos, bailados
de pés e troncos entrançados.
Instantes lúdicos: flutua
o jogador, gravado no ar
— afinal, o corpo triunfante
da triste lei da gravidade.
Rubens Pontes é jornalista, poeta, escritor, atleticano
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